sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Memória olímpica (II)




Nasceu uma bandeira


A largada de pombos na cerimónia de abertura dos Jogos de Antuérpia estava longe de ser uma inovação, pois já em Atenas, em 1896, as aves da paz tinham sido incluídas na liturgia olímpica. A novidade de 1920 estava no número de columbinas (2606, tantas quantos os atletas presentes) e no facto de cada uma ter seguro numa pata uma fita com a cor do país do participante que representava.
A largada de pombos de Antuérpia era, apenas, um primeiro sinal de um conjunto de símbolos que se tornariam constantes a partir daí.
Foi em Antuérpia que se ouviu pela primeira vez um atleta (Victor Boin) proclamar: “Nós juramos que nos apresentamos nos Jogos Olímpicos como competidores leais, respeitadores dos regulamentos que os regem e desejosos de neles participar com espírito cavalheiresco, para honra dos nossos países e glória do desporto”.
O julgamento inspirava-se, como acontece com toda a liturgia olímpica, nos jogos da antiguidade, nos quais a cerimónia do juramento consistia em colocar a mão direita sobre o altar sagrado e, voltado para a estátua de Zeus, o atleta furar, em voz alta, “acatar o regulamento dos jogos, de não ter cometido nenhum sacrilégio e de competir com inteira lealdade”.
Também da antiguidade provém aquele que hoje identificamos como o símbolo máximo dos Jogos: os anéis olímpicos. Tal como o juramento, foram idealizados pelo Barão de Coubertin, que entendeu poderem os cinco anéis esculpidos no altar de Delfos – cujas ruínas tinham sido encontradas por uma expedição arqueológica francesa, no final do século XIX – representar o seu movimento e a sua mensagem de paz.
Preparavam-se os jogos de 1912 e Coubertin decidiu plasmar os anéis numa bandeira, toda branca, que encomendou aos armazéns parisienses “Au Bon Marché”, com a recomendação de que fosse feito apenas um exemplar.
O Barão idealizara que, sobre o fundo branco, os cinco anéis, entrelaçados, fossem pintados nas cores vermelha, verde, amarela, preta e azul. Ao contrário do que é comum afirmar-se, não existe correspondência directa entre as cores e os cinco continentes que representam os anéis olímpicos. As cores foram seleccionadas, apenas, de forma a conter os tons usados nas bandeiras nacionais dos países do mundo.

Regista a história que a ideia do presidente do COI era entregar o estandarte olímpico na cerimónia de abertura dos jogos de Estocolmo, mas terá sido convencido a não o fazer pelo seu colaborador e amigo Angelo Bolanaki (também ele membro do COI), que lhe pediu que guardasse a apresentação do estandarte para 1914, ano da comemoração do 20º aniversário da fundação do movimento olímpico.
Assim, a bandeira apenas apareceu pela primeira vez aos olhos do público no Egipto, na cerimónia de inauguração do estádio de Chatby, no mesmo ano em que, em Paris, a assembleia do COI a consagrou oficialmente como símbolo da organização olímpica mundial.
O símbolo estava adoptado, mas a guerra eclodia e os jogos de 1916 (que deveriam ter lugar em Berlim) viriam a ser anulados. Apenas em Antuérpia, em 1920, a bandeira olímpica compareceu nos Jogos, para não mais deixar de estar presente, dominando o estádio, lá do alto do mastro mais alto, como símbolo de paz e da unidade dos cinco continentes.


(in "Jogos Olímpicos - Um século de glória", edição jornal O Público)

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